Pai, filho. Avô, neto. Bisavô, bisneto. Tataravô, tataraneto. A família anda tão desfragmentada... mas isso ainda existe.
Não é mentira, Vassia Tolstoi nasceu em Paris, e sua ascendência é russa e nobre, pois é tataraneto do conde Lev Tolstoi, autor de “Guerra e paz”, “Anna Karenina”, “A morte de Ivan Ilyich”, “A sonata Kreutzer”, etc.
Veio passar dois meses, está há dois anos, e aqui conheceu a carioca Daniela na pizzaria Guanabara às cinco da manhã, coisas de amor à primeira vista. Resumindo: casaram-se ao som de Clara Nunes em Santa Tereza. Moram entre o morro do Vidigal e a favela Chácara do Céu (subindo quatro lances de escada) numa casa avarandada bem no meio do mato. Querem mais? Tem um Fusca 70.
“O dinheiro representa uma nova forma de escravidão impessoal, em lugar da antiga escravidão pessoal” - frase do Conde num de seus contos, ”O dinheiro”- que resume a postura do tataraneto concernente a valores, certamente herdados da família.
Sua origem nobre vem com a czarina Catarina, que sobe ao trono com o apoio de Tolstoi. Por causa deste detalhe recebe dela o título de conde, um marco na vida do escritor. O título passou de Lev ao filho Nicholas, (bisavô de Vassia) poeta e músico cujo filho médico, Serge, foge para a França durante a revolução russa, e em Paris nasce o pai do rapaz de 31 anos , morador do Rio.
Vassia nunca trocou a amizade dos amigos plebeus pelo que restou da aristocracia européia com suas festas vips. Mesmo aqui, prefere “um samba na Mangueira do que beber champagne numa mansão no Leblon”. Herança do tataravô? Possivelmente, e foi assim desde criança. Só tomou consciência de sua origem aos catorze anos quando fez bagunça na aula de geografia. Como castigo a professora mandou que fizesse na semana seguinte um seminário sobre sua família, e aí a ficha caiu.
Foi à Rússia a primeira vez depois da queda do muro de Berlim, e levou um choque quando leu no jornal que estava no país. “Se te vêem apenas como um descendente de Lev Tolstoi, você não é ninguém”, disse.
Trabalhou como DJ, fotógrafo, quando “tinha contato com pessoas histéricas e estúpidas, com modelos anoréxicas tratadas como lixo, um drama, isso só para vender roupas”. Aí largou tudo: o dinheiro, as belas mulheres, a moda. Cansado de trabalhar como um louco, viajou para conhecer os parentes da mãe uruguaia, depois veio ao Rio, onde foi ficando. Como fotógrafo da Paris Match , tem um projeto próprio: publicar os retratos dos 700 freqüentadores do posto 9, em Ipanema, clicados num estúdio improvisado na praia, dentro da barraca de um vendedor de cerveja!
Por que esta matéria aqui? Primeiro, o cara é descendente de um gênio escritor, segundo, os tempos são outros, mas ele optou por ser ele próprio, optou por viver de acordo com os seus valores, renunciando a outros.
Isto é algum exemplo? É. Pois para escrever – um exercício solitário – você renuncia a muitas coisas, além de ler e ler e ler para se impregnar de boa Literatura, ou da má também, se tiver tempo. Escrever é cortar, para ir ao âmago da escrita.
Claro que há outros exemplos mais edificantes, mas este é sui-generis, um aristocrata que renuncia a Dior e batuca Martinho da Vila, pois foi batucando com dois talheres "Rosa do povo", de Martinho, que ele recebeu o repórter da Piauí, revista de onde veio este resumo.
domingo, 4 de maio de 2008
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